Eu acho que…
Chegámos mais uma vez (e felizmente) ao tão esperado final de ano. Época de festas, de família, mas também de balanço, de objetivos, e para alguns, de fecho de negócios que podem mudar resultados. Final de ano significa também pensar no que nos espera para o ano que vem, como vamos trabalhar, e até como podemos reagir a vários cenários. Se neste momento, como eu, já o planeou, estará apenas expectante para começar a trabalhar no que de facto por aí vem.
Para as pessoas mais through time, que vivem com uma visão de futuro, todo o planeamento faz sentido, claramente à data de hoje já o fizeram e estão apenas à espera de uma última validação para ser aprovado ou posto em prática. Para as pessoas in time, que vivem mais o aqui e o agora, estão neste momento a pensar em começar o processo de planeamento que muitas vezes só termina nos primeiros dias do próximo ano.
Ambas as formas resultam, afinal, cada pessoa é como é, e deve seguir o que já sabe que resulta para si, desde que cumpra efetivamente o seu planeamento e o aplique.
Para planear é fundamental ter dados (para ter dados é necessário, lá está, planear). Numa primeira fase, dados mensuráveis internos que vivem de um registo metódico sobre a atividade exercida para avaliar o que se planeou, e o que realmente aconteceu. Perceber o porquê e saber como reagir para produzir melhores resultados é essencial para projetar o ano que aí vem.
Para além do planeamento, a ambição é também uma variável que influencia o seu futuro ano, e é também variável em função de cada um. Mais uma vez, está tudo certo, se tiver certo consigo próprio. Mesmo que as melhores frases de motivação nos digam que tudo é possível, ou melhor ainda, que o céu é o limite, para que de facto isso seja verdade, será importante fazer uma análise da sua atuação, da conjuntura do mercado e das tendências para ter os pés bem assentes na terra quando aponta para o seu objetivo.
Em mercados perfeitos onde a existência de dados não é um problema, é relativamente fácil projetar, mas na atividade imobiliária é exatamente o contrário. A falta de dados concretos e principalmente previsionais, fazem com que o mais positivo dos empreendedores jogue sempre na incerteza, provoca um certo desconforto, e acaba por levar ao uso da inevitável expressão “eu acho que”, afinal, são formas menos lógicas de acalmar a mente que funcionam à base de feelings que muitas pessoas dão o nome de achologia.
Mas será que mesmo num mercado tão imperfeito como o imobiliário é possível ter em atenção alguns indicadores cruciais para apoiar o seu Plano de Negócio para o próximo ano? Eu diria que sim, mesmo na incerteza será necessário considerar alguns indicadores chave para poder projetar a sua estratégia para o próximo ano na sua atividade de Mediação Imobiliária…
- Mercado do vendedor ou do comprador? Diz-se que estamos num mercado do vendedor quando a oferta é mais pequena do que a procura. Quando isso acontece, normalmente os preços sobem, a transação é mais rápida (menos de 4 a 5 meses em Portugal) e o cliente com mais dificuldade em comprar ou arrendar, é o cliente comprador, o cliente que vai precisar de mais ajuda. No mercado do comprador, acontece precisamente o contrário, a oferta é maior o que a procura, os preços têm tendência a descer e o mercado torna-se mais lento em relação ao tempo de transação (acima dos 9 meses em Portugal), logo, o cliente que vai precisar de mais ajuda será o vendedor.
- Os preços vão subir ou baixar? Aqui teremos de perceber bem o comportamento da procura e não apenas da oferta, afinal, é o comprador que faz o preço e não o vendedor (como se pensa). Assim sendo, a análise de capacidade de aquisição por parte do comprador será fundamental e pensando que o seu cliente necessitará provavelmente de financiamento para adquirir o imóvel, será importante perceber como estão as taxas de juro, qual a tendência prevista, se vai ou não haver alterações nas condições dos empréstimos, por exemplo: loan to value – relação entre o financiamento e as garantias que define até quanto um banco poderá emprestar; taxa de esforço – relação que mede até onde uma pessoa pode endividar-se; prazos de empréstimo – quanto mais curto, pior, pois significa que a prestação será mais alta e assim o comprador terá menor capacidade de obtenção de capital de financiamento. A inflação do país também é um elemento-chave para verificar se haverá uma eventual subida ou não de preços.
- Quem é o cliente? Pode parecer estranho, mas a tendência de pensar em todos é totalmente errada. Ter um público-alvo que faça sentido para si, para o seu negócio e para a sua área e zona de atuação é e será sempre mais interessante para conseguir planear e definir as suas estratégias de marketing. O seu cliente é português ou estrangeiro? Se for estrangeiro, de que origem? São compradores ou vendedores? Qual é o segmento A, B, C ou D? São utilizadores ou investidores? E principalmente, o que é que os incentiva e preocupa? Ou seja, qual o problema que eu me devo propor a resolver?
- Tempo de Absorção? Quando falamos nos mercados do vendedor e comprador acabamos inevitavelmente por falar sobre este ponto: em média, em quando tempo um imóvel se transaciona na sua zona? Atenção, pense no seu mercado local e não no país, afinal, deve ter dados gerais, mas os específicos, como os da zona onde atua, são os fundamentais e este indicador é de extrema importância tendo em conta que na atividade da Mediação imobiliária só se recebe se o imóvel for vendido e normalmente quando a transação é realizada, ou seja no CPCV – Contrato-Promessa de Compra e Venda ou mesmo na Escritura, o seu planeamento e pipeline tem de ser o mais afinado possível para não ter longos períodos de “travessia do deserto”. Apesar de ser um indicador aparentemente não acessível pelo comum dos mortais, é extremamente fácil de obter, basta seguir todos os seus contratos de angariação, contando o tempo desde o momento em que o imóvel começa a ser promovido, até ao dia que ele é vendido (entenda-se, quando a oferta é aceite pelo proprietário e o imóvel é retirado do mercado). Pode e deve ainda monitorizar os imóveis dos seus colegas, sejam eles concorrentes ou não. A tecnologia ajuda, as Metasearch como a CASAFARI são ótimas ferramentas para obter dados fidedignos de mercado.
- Número de Transações? O número de transações são elemento essencial para qualquer plano de negócio na atividade de Mediação Imobiliária, como referi atrás, só se recebe se houver transação, por isso, quando se define um objetivo em valor absoluto (valor de faturação), deve sempre traduzi-lo em número de transações. Para isso será importante saber o valor de cada venda e para o conseguir, terá de ir novamente ao mercado para perceber os valores reais de venda de um passado recente (verifique os tempos de absorção), e os valores atuais de venda ou de eventual projeção futura (sempre no mercado em que atua), depois, terá de multiplicar esse valor pela comissão que cobra sobre cada valor de venda (geralmente 5% + IVA), no caso de partilhar o seu negócio com outro colega, terá ainda de dividir o valor da sua comissão pela percentagem acordada para partilha (normalmente 50%), assim, vai saber quantas transações vai necessitar de efetuar para chegar ao seu objetivo. Mas espere, terá de fazer uma conta importante para perceber se o seu objetivo cabe no mercado onde atua, ou seja, terá de avaliar quantas vendas e transações se fizeram no seu mercado para perceber se a sua projeção está em linha (tendo em conta que não existe um sistema de centralização global de informação de mercado com registo destes dados , ou seja, como os MLS, pode obter esta informação fragmentada em bases de dados como o Confidencial Imobiliário, INE ou fazendo a sua própria medição diária do mercado), verifique também o que fizeram os seus concorrentes e será mais uma forma de perceber se o seu objetivo faz realmente sentido, ou seja, se é realmente viável.
Os mercados imperfeitos como o imobiliário tem características muito próprias, a escassez de informação, o tempo de transação, ou até comportamentos atípicos podem condicionar eventuais planos de quem opera neste mercado. Tem de saber o que medir e como medir para não cair na tentação de basear o seu planeamento na célebre frase “eu acho que…”.
Artigo de Massimo Forte publicado na revista DOit