Arrendamento residencial, o parente pobre da Mediação?
O mercado imobiliário em Portugal tem vindo a ser pautado pela tendência de crescimento da procura de habitação própria e permanente em detrimento do arrendamento, por isso pergunto, até quando o arrendamento residencial continuará a ser considerado o parente pobre da Mediação?
Se nos focarmos nas principais cidades (Lisboa e Porto), o mercado de arrendamento foge ligeiramente da tendência e torna-se mais dinâmico mesmo tendo de lidar com uma realidade de políticas de visão de curto prazo, de instabilidade legal e de contínua escassez de produto.
Quando se fala de arrendamento, por um lado temos fatores como o congelamento das rendas e os processos de despejo muito pouco céleres e complicados que fazem com que o investimento seja canalizado para canais mais dinâmicos que o arrendamento habitacional de longa duração. Por outro, temos uma tendência de valores crescentes de rendas e uma escassez de produto que continuam a promover o comportamento de compra.
O arrendamento nas áreas urbanas em Portugal são um desafio estrutural.
Um desafio a ultrapassar pelo Estado em conjunto com privados com o objetivo de se conseguir criar mais e melhor oportunidade de investimento e habitação. O Estado tem um papel fundamental de fomentar acesso à habitação e os investidores têm de ter condições para continuar a contribuir para a valorização do parque habitacional, não só para um segmento em específico, mas para todos os que necessitam de uma alternativa à compra que cada vez se tornam mais expressivos pela conjuntura atual.
Na atividade de mediação imobiliária, a operação de arrendamento está em linha com a tendência: mais foco na venda e menos foco no arrendamento.
Seja pela dimensão do mercado, seja pelos valores mais baixos de comissão, o arrendamento residencial sempre foi visto pela mediação como o seu parente pobre por ser uma transação menos interessante e pouco rentável.
Mesmo com a vantagem de trabalhar uma transação menos complexa e mais rápida, há mais de 30 anos que a mediação imobiliária se focou no florescimento do crédito à habitação e nas comissões cada vez mais incentivadoras geradas pelo segmento da venda (em média em Portugal as comissões variam entre os 3% a 5% + IVA sobre o valor da transação), inevitavelmente, vão deixando para segundo plano o arrendamento que hoje se debate com a escassez como mais um fator dissuasor.
Contudo, será importante referir que quando se adquire um imóvel através de financiamento pode até ser desvantajoso fazê-lo se por exemplo o valor financiado for elevado, face ao valor do imóvel (70/80% ou mais), e ainda se cumprir com o contrato de mútuo até ao seu final, o valor pago na totalidade pode superar largamente o dobro do preço do imóvel.
Apesar dos factos, as pessoas continuam a querer comprar, pelo menos até o conseguirem fazer.
Nas duas últimas décadas o mercado de arrendamento teve alguns anos de superação e evolução da procura e oferta, justamente no período da TROIKA, período em que os bancos foram obrigados a limitar crédito e em alguns casos, as prestações superavam o valor das rendas.
Nesta fase surge um fluxo de transações de arrendamento que serviram de balão de ar para muitos mediadores imobiliários que acabaram por ter de se contentar e até alavancar com os arrendamentos superando assim algumas dificuldades financeiras que esse período lhes impôs.
Será importante salientar que atualmente em Portugal uma empresa de mediação imobiliária cobra entre 1 e 2 meses de comissão para promoção e realização de uma transação de arrendamento, entenda-se, uma transação que implica encontrar um inquilino para o imóvel e formalizar o arrendamento.
Esta comissão é cobrada somente uma vez e apenas ao senhorio, ou seja, ao proprietário do imóvel e não ao inquilino, muito à semelhança do que acontece com as transações de compra e venda.
Passaram de planos de negócios onde o arrendamento nem se quer era considerado, para uma atividade de fonte de receitas essencial para equilibrar o negócio.
Na altura, alguns analistas até arriscaram a hipótese de que o arrendamento iria ser a nova tendência, iria arrancar definitivamente em Portugal como solução para habitação e iria inverter a tendência cada vez mais crescente do comportamento de compra e venda muito baseado na esperança na mudança de mentalidade em relação à posse, principalmente nas camadas mais jovens.
Mais uma vez foi sol de pouca dura, bastou que o dinheiro ficasse mais barato e que os bancos abrissem novamente portas ao crédito imobiliário, quando se atingiu o ponto da prestação ficar novamente mais barata do que a renda, entramos de novo num ciclo de compra e venda deixando mais uma vez os incentivos ao arrendamento para trás.
Com isto será fácil perceber que a maioria das pessoas pensa no curto prazo e toma decisões emocionais no momento e muitas vezes sem pensar, ou melhor, sem observar cenários e fazer contas a médio e longo prazo para perceber como podem reagir a flutuações.
Até ver o arrendamento hoje parece ter voltado ao que era nos anos 90’ e em grande parte da primeira década deste século, ou seja, escasso, caro e até precário.
Este último adjetivo tem a ver com o tipo de edificado disponível, muitos imóveis não têm manutenção e proliferam negócios onde se arrenda partes de casas ou espaços não designados para habitação, em muitos casos, sem registo do contrato nas finanças, hábito ainda não solucionado e que permite uma deliberada fuga aos impostos por parte do proprietário e algumas ações menos nobres em eventuais necessidades de despejo.
Parece algo estranho e arcaico, mas ainda prevalecem este tipo de práticas um pouco por todo o país porque para alguns, simplesmente não há outra solução.
O ciclo imobiliário está a mudar, os valores de venda estão cada vez mais altos e mesmo que se preveja uma estabilização, os portugueses de classe média, média baixa e baixa vão ter cada vez mais dificuldade na obtenção de financiamento para aquisição de casa própria e possivelmente o arrendamento voltará a ser novamente a única opção disponível, no entanto, para ser uma opção tem de existir disponibilidade e havendo ainda uma escassez que leva tempo a equilibrar adivinham-se tempos difíceis em que a mediação pode ajudar servindo de solução para pessoas que procuram uma saída.
O mercado do arrendamento terá um novo despertar e as empresas de mediação deverão preparar-se pensando um pouco mais para além do serviço da transação em si.
Se o mercado do arrendamento residencial começar a dar sinais de crescimento, como eu prevejo, seja em que segmento for, o foco e o serviço deverão ser ampliados.
Vejamos, os investidores buy to let (compra para arrendamento) não pretendem apenas realizar a transação, o seu principal objetivo é o da continuidade do seu inquilino, pois é aí que reside a chave da sua rentabilidade. Ter um bom inquilino, ou seja, alguém que pague a renda a tempo e horas e que faça bom uso do seu imóvel será para este investidor um dos fatores críticos de sucesso e as empresas de mediação que estejam focadas em promover este cenário, serão possivelmente e com muita naturalidade a primeira escolha de quem investe para arrendar.
Mas para criar valor neste segmento, será fundamental olhar para este tipo de serviço de mediação imobiliária de uma outra forma. Oferecer realmente valor para quem é senhorio e claro, também para quem é arrendatário.
Se se quer focar no arrendamento, crie valor, faça a diferença.
Alguns exemplos:
– Carteira de oferta de qualidade e adaptados ao segmento ou segmentos de arrendatários;
– Qualificação cuidadosa dos arrendatários;
– Tratamento de documentação para senhorio e arrendatário
– Gestão da relação entre senhorio e arrendatário, tendo como base o cumprimento do contrato;
– Criação de serviços associados ao arrendamento como manutenção, limpeza, serviços adicionais adaptados ao estilo de vida do target etc.;
– Procura de novas oportunidades de investimento para os senhorios;
Apesar de ainda existir um estigma associado ao arrendamento em Portugal, sempre li que os mercados imobiliários saudáveis e equilibrados têm de ter um bom mercado de arrendamento, infelizmente, não me parece ser este o caso de Portugal.
Artigo original de Massimo Forte para brainsre.news aqui