23 de Agosto, 2017

A ALTERAÇÃO LEGISLATIVA DO TRATAMENTO DO TEMA DA “EXCLUSIVIDADE” – EVOLUÇÃO OU RETROCESSO?

Massimo Forte

 

 

  1. Enquadramento legal

 O Decreto-Lei n.º 211/2004, de 20 de Agosto, abordava o tema da exclusividade em dois artigos distintos: o artigo relativo à remuneração – artigo 18.º – e o artigo relativo ao contrato de mediação imobiliária – artigo 19.º.

O artigo 18.º dispunha que a remuneração só era devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, exceptuando-se os casos em que “o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado, em regime de exclusividade, com o proprietário do bem imóvel, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo esta direito a remuneração”.

Em sede do artigo 19.º – que dispunha sobre o contrato de mediação – a lei como que explicava o que é a exclusividade num contrato de mediação imobiliária, dizendo que “Quando a empresa de mediação é contratada em regime de exclusividade, só ela tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência, e ainda que a consagração do regime de exclusividade, quando exista, terá de constar expressamente do contrato de mediação imobiliária.

Esta previsão legislativa tinha a vantagem de esclarecer o conceito de “exclusividade” no âmbito da mediação imobiliária, tendo como destinatários os mediadores imobiliários e acima de tudo os consumidores, clientes dos mediadores imobiliários.

A Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro, veio introduzir uma alteração no tratamento da questão da exclusividade que, na nossa opinião, impõe aos profissionais da mediação uma responsabilidade acrescida no esclarecimento do cliente.

Com efeito, dispõe o artigo 16.º que do contrato deve constar, obrigatoriamente, “a referência ao regime de exclusividade, quando acordado, com especificação dos efeitos que do mesmo decorrem, quer para a empresa quer para o cliente.”

 

Do artigo 19.º – Remuneração da empresa, continua a constar que “É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.”

Ou seja, a lei anterior protegia os profissionais da actividade da mediação porquanto era a própria lei que explicava o que é a exclusividade – Quando a empresa de mediação é contratada em regime de exclusividade, só ela tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência – impondo apenas aos mediadores que a consagração do regime de exclusividade constasse expressamente do contrato de mediação imobiliária.

A lei actual o que faz é responsabilizar os mediadores pela explicação ao cliente do que é a exclusividade, impondo que a referência ao regime de exclusividade, quando acordado, venha acompanhado da especificação dos efeitos que do mesmo decorrem, quer para a empresa quer para o cliente.

Veja-se, pois, a fragilidade do que resultou desta alteração para a actividade de mediação.

Antes, a própria lei assumia a responsabilidade – como deveria sempre de assumir – de esclarecer o que se entende por exclusividade e os seus efeitos.

Agora, é o mediador que tem de explicar ao cliente o que é a exclusividade e os efeitos da opção pela exclusividade. E tem de assumir a responsabilidade pelo que explicou ou deixou de explicar.

Note-se que a grande maioria dos contratos de mediação imobiliária que são utilizados na actividade não são feitos “à medida” do cliente, são simples impressos onde se tem de preencher a identificação das partes, o imóvel, o valor do negócio, a comissão acordada e pouco mais.

E para que não se abra a porta a que algum cliente possa negar-se ao pagamento de uma comissão quando a mesma é devida no âmbito de um contrato celebrado com exclusividade, é importante e sempre o aconselhamos, que o contrato continue a manter o texto da anterior legislação.

De facto, embora a letra da lei tenha alterado, suprimindo a definição do que é a exclusividade, a verdade é que o seu espírito se mantém e que o antes era considerado exclusividade continua a sê-lo, sem qualquer alteração.

Com efeito, a exclusividade era e continua a ser o direito de uma mediadora ser a única a promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência, ou seja, a única entidade a ter a angariação do imóvel. Nada mudou.

O que mudou foi quem é o mensageiro da informação ao cliente. E o novo mensageiro é o mediador cuja actividade é a mediação imobiliária, não é a explicação de conceitos jurídicos a um cliente.

Daí reiteramos que, na nossa opinião, qualquer contrato que seja celebrado em regime de exclusividade deverá sempre continuar a fazer referência à antiga explicação legal do que é a exclusividade.

Relativamente à abrangência da exclusividade, recorde-se dado que nem sempre é claro, que o cliente é livre de, durante o período de exclusividade, celebrar o negócio com terceiro que não lhe tenha sido apresentado pela mediadora, sendo que, nesse caso, esta não tem direito a qualquer comissão.

Este é o entendimento da jurisprudência dos tribunais superiores no âmbito da antiga legislação – mas que nada alterou para a actual – veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães datado de 20/4/2010, e o Acórdão datado de 5/11/2015, do Tribunal da Relação de Évora.

Refere a Relação de Guimarães que no contrato de mediação imobiliária, o regime de exclusividade visa proteger o interesse da empresa mediadora em só ela diligenciar no sentido da realização do negócio intencionado, de modo a garantir a correspondente remuneração.

Essa exclusividade visa, antes de mais, afastar a intermediação de qualquer outra mediadora.

Sempre que essa exclusividade se reporte apenas ao direito de promover o negócio intencionado, a mesma tem de ser interpretada restritamente, no sentido de «mediação exclusiva» ou «intermediação exclusiva».

Nesse caso, o comitente não pode diligenciar no sentido de angariar, por si, interessados no negócio, mas não fica inibido de aceitar qualquer proposta que lhe seja apresentada por algum que espontaneamente se lhe dirija.

Todavia, se durante a vigência do contrato de medição, em regime de exclusividade, a mediadora apresentar ao comitente um interessado no negócio, ele não poderá preteri-lo, sem ficar obrigado a pagar a remuneração acordada, mesmo em face de um outro que lhe ofereça melhores condições.

Um regime de exclusividade absoluta (impeditivo da aceitação de propostas não procuradas por parte do comitente) não decorre da letra do art. 18º, 2, a), do Dec.-Lei nº 211/2004, 20/VIII, tendo de ser expressamente convencionado.

O Acordão da Relação de Évora, já bastante mais sucinto, apenas dizendo que “No contrato de mediação imobiliária o alcance da norma do nº 4 do art. 19º do Dec. Lei 211/2004, de 20/08, em conjugação com a norma do art. 18º, nº 2, al. a), do mesmo diploma legal, não afasta a possibilidade do comitente aceitar negócio que directamente lhe for proposto por interessado não angariado pela mediadora.

Em ambas as acções os respectivos clientes venderam diretamente a terceiros, no decurso dos respectivos contratos, os imóveis objecto de contratos de mediação imobiliária celebrados com exclusividade, e em ambos os casos os tribunais entenderam que não era devida qualquer comissão.

 

Artigo da autoria de

JOSÉ NUNO ANTUNES

RITA GOUVEIA PEREIRA

Advogados especialistas em Mediação Imobiliária

 

Comentários (2)

Massimo Forte

24 de Agosto, 2017

Muito obrigado pelo seu comentário, na minha opinião com ou sem legislação (conheço vários países que não têm legislação na Mediação Imobiliária) a base de trabalho entre um Agente Imobiliário e o seu cliente vendedor é a relação de confiança entre os dois, que se desenvolve num trabalho em equipa: um vende, o outro ajuda a vender numa plena e transparente colaboração. Se não existir este pressuposto não fará sentido existir um CMI em exclusivo, mais vale o proprietário vender sozinho ou quem sabe em regime aberto.

Elisabete Monteiro

24 de Agosto, 2017

Portugêsmente falando, comprador espontâneo com cmi em exclusivo ou terceiros que se apresentem à margem do mediador, é chamar ótario aos agentes imobiliários! Isto mais parece uma medida convenientemente criada para o aproveitamento de alguns. Coisa que se veio a revelar com o processo golden visa onde entre outras figuras consta o ex-presidente do IRN, etc etc...quando é celebrado um cmi em exclusivo há um plano de marketing apresentado e implementado desde da porta do imóvel ao resto do mundo (leia-se fisica e virtualmente) desde a placa à publicação virtual. Onde fica ou como justificam os tais terceiros ou espontâneos? Esses só são contemplados se no local de trabalho dizem que têm a casa à venda e mostram a casa num dos sítios da net, mas aí já não são espontâneos. O espontâneo/terceiros vem antes de qualquer tipo de contratação/divulgação de um mediador. Porque a partir do momento em que está contratado em exclusivo é do interesse do angariador que toda "gente" fique a saber que aquele imóvel está à venda, logo qualquer espontâneo ou terceiro teve uma ignição chamado investimento da mediação imobiliária. Pela minha ordem de ideias essa alteração à lei é um retrocesso chamado conveniência.

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