O que penso da Cultura Associativa em Portugal
Fui procurar a definição da palavra associação, a primeira coisa que me saltou à vista foi que o verbo associar, é sinónimo da ação de juntar, unir, aproximar.
Em relação à entidade em si, verifiquei que tem como objetivo principal o de congregar pessoas com interesses comuns, surgido deste princípio o conceito de associação profissional.
De facto, e penso que concordará comigo, qualquer associação profissional, antes de ser uma associação, deve ter a capacidade de ser uma comunidade, outro conceito que por vezes em Portugal é difícil de ser compreendido.
A comunidade é um grupo de pessoas que partilham algo em comum e o sentido de pertença é o que as define, não existindo este sentimento, será desde logo muito difícil construir pontes, ou seja, construir associativismo.
Há grupos que desenvolvem o sentido de pertença de forma natural porque existe algo ainda mais forte e profundo do que o seu sentimento de pertença, existe propósito.
Propósito. Todas as empresas, grupos, equipas e pessoas de concretização com foco no sucesso a longo prazo têm um e no caso da Mediação Imobiliária, sempre salvaguardando que esta é apenas a minha opinião, o propósito de uma associação deve estar no servir e fazer evoluir os seus associados defendendo os interesses dos profissionais de mediação imobiliária.
A associação não é dos órgãos sociais, é dos associados que a elegeram como representantes para garantir a construção das tais pontes entre interesses e interessados e é por isso que se deve garantir uma participação próxima e representativa para que a associação cumpra o seu propósito de contribuir em prol de todos.
Curioso que no mercado mais evoluído do mundo na área de mediação, falo dos Estados Unidos da América, é muito comum verificar que nas associações de mediação imobiliária os mandatos são bem mais curtos do que em Portugal e quem é eleito, é eleito por competência e vontade própria de se dedicar à causa em prol de todos. Na maioria das vezes são Agentes ou Mediadores que se candidatam e depois, com muita naturalidade e consciência do dever de garantia de representatividade, passado dois anos entregam o seu mandato a outros sem se poderem candidatar novamente, evita-se o alimentar de egos e contribui-se realmente para a causa.
Na minha opinião as associações têm uma importância fundamental para a profissionalização atividade de mediação imobiliária, nomeadamente porque estão em posição de comunicar, representar e defender de forma organizada e forte os interesses de quem representam e para quem realmente trabalham.
Sim, apesar da tentação de agradar mais a quem as apoia mais, as associações têm de trabalhar para TODOS os seus associados e para ser bem sucedida nesta representação é fundamental garantir canais abertos e constantes para escutar os seus associados de forma próxima. Não deve apenas contemplar-se a internet e muito menos a obrigatoriedade dos associados se terem de deslocar à sede para partilha de tendências, necessidades ou boas práticas, é exatamente o contrário, é ir ter com eles mobilizando-se e mobilizando-os com ações locais, relevantes e principalmente constantes que garantam pelo menos dois grandes objetivos:
- Ouvir os sucessos, problemas e necessidade de cada um;
- Dar feedback para os ajudar a partilhar boas práticas e soluções que os ajudem a elevar a sua atividade e os seus resultados.
Traduzindo na prática o que quero dizer: criar planos de ação anuais que contemplem formas de informação regular como dados de mercados, estatísticas, tendências, pessoas, experiências; formação; consultoria operacional; consultoria jurídica; consultoria de marketing; divulgação e apoio na disponibilização e aplicação de ferramentas tecnológica; criação de parcerias de apoio ao negócio; criação de eventos regulares de partilha etc.
Indiscutivelmente outro grande objetivo de uma associação tem de ser o de saber exercer influência junto de quem regula, mas a ligação com o Estado não deve limitar-se apenas à vertente legal, deve saber ajudar o Estado a compreender a necessidade de criação ou defesa de regulamentação necessária com um único propósito, a valorização presente e futura do setor.
Outro papel que considero mesmo fundamental para qualquer associação, é o da regularização de comportamentos e atitudes entre pares, e no caso da mediação imobiliária, também entre a mediação e os seus clientes. É o que dá origem ao código de ética que deve ser o primeiro grande apoio aos manuais de procedimentos que empresas e profissionais desta área devem seguir desde a primeira hora da sua atividade. Contudo, para que haja uma normalização de boas práticas, comportamentos e atitudes não basta existir formações teórico-práticas, têm de se desenvolver ações pedagógicas contínuas e principalmente conselhos arbitrais (compostos evidentemente por associados representativos e relevantes) que as façam cumprir quando não acontecem garantindo que há supervisão capaz de resolver as mais diversas situações que surjam na comunidade para criar não só uma sensação de respeito, como a de procura de uma solução conjunta para elevar a mediação imobiliária.
Na mediação imobiliária existe um tema que normalmente tem um impacto enorme na união de pessoas e empresas desta área por ter um poder quase conceptual de estar no cerne deste negócio… goste-se ou não, faça-se mais ou menos, o importante é caminhar para se fazer, seja de que forma. Estou a falar da partilha entre os profissionais.
A partilha deveria fazer parte do código ético, eventualmente, é um tema que poderia até ser objeto de legislação, afinal, se o propósito é o da união, e se a ideia é termos uma atividade profissional respeitada porque defende os interesses de quem representa, garantindo o interesse comum entre todas as partes, interesse este que se foca na garantia de transação nas melhores condições possíveis e no menor espaço de tempo, a lógica da partilha deveria ser uma prática natural.
A partilha é difícil, afinal, cada empresa é uma empresa e cada pessoa é uma pessoa, o que torna muitas vezes desafiante e difícil a ação de união pelo interesse comum, no entanto, não faltam soluções e ferramentas para implementar esta atitude. Conhecemo-las como MLS – Multiple Listing Services, em Portugal podem designar-se como Sistemas de Angariação Múltipla, são ferramentas alavancadas em softwares que permitem não só aumentar a probabilidade de faturação entre profissionais, como ganho de quota de mercado face às vendas ditas diretas, ou entre compradores e proprietários/vendedores.
Sistematizar a partilha eleva a mediação por garantir mais rapidez de acesso a informação, mais transparência e maior segurança nas transações, já para não falar na possibilidade de garantir acesso a melhor conhecimento de todo o mercado pela recolha de dados não apenas do mercado da oferta, mas da transação efetiva, outro tema de grande responsabilidade das associações.
Em Portugal não existem MLS’s porque não existe uma cultura de associativismo e permitam-me a minha opinião mais uma vez, possivelmente porque não há interesse neste sentido…
Artigo original de Massimo Forte para revista Imobiliário em Direto