11 de Abril, 2018

Os ciclos da Mediação Imobiliária

Massimo Forte

Para perceber o que podemos encontrar no futuro, podemos começar por falar com pessoas que já tenham passado por várias experiências de forma repetida, desta forma, podemos avaliar se de facto existe uma tendência que revele uma lógica de causa-efeito, e que possa servir de orientação para decisões a longo prazo.

A experiência é um forte indicador quando é avaliada de forma sistematizada, mas acima de tudo, é uma grande ferramenta quando é vivida.

Para fazer uma análise do que está acontecer hoje no mercado imobiliário português, e consequentemente na mediação imobiliária, será necessário ter a capacidade de olhar de cima com um sentido de visão alargada, pode até significar que se deva olhar para mercados mais evoluídos, com mais histórico e experiência do que é a atividade de mediação imobiliária. O mercado Norte-Americano é um excelente exemplo para estudo, com mais de um século de mediação imobiliária, constituí uma importante fonte de informação e experiência que serve de orientação para uma análise comparativa, é neste mercado que também se encontra muito material de apoio sobre ciclos de mudança, recomendo vivamente o livro “Shift” de Garry Keller.

Olhando agora mais de perto, e analisando o mercado português no início dos anos 90, pode-se verificar um ciclo de ascensão, existia escassez de produto, havia menos oferta, e começava a existir procura que começou a ser sustentada pelo financiamento, definitivamente, o setor imobiliário começava a estar na moda, não só para a compra de habitação ou imóvel, seja para que destino fosse, e também para o negócio da mediação imobiliária que viu a sua atividade florescer. Nesta fase a mediação imobiliária era uma atividade pouco organizada, sem formação, e considerada como uma atividade secundária, pois muitas pessoas tinham outras atividades para além da mediação, a mediação imobiliária era vista como um atividade de oportunismo devido à facilidade de ganho rápido de dinheiro. Os preços dos imóveis subiam e a construção mantinha um ritmo alucinante de criação de obra nova produzindo stock para satisfazer essa procura. No início deste ciclo havia claramente um desequilíbrio entre oferta e procura, havia mais procura que oferta, a mediação designa este mercado como mercado de vendedor, quem tinha produto era rei, ou seja, o mercado estava favorável para quem vendia e não para quem comprava.

Sendo a habitação uma necessidade básica, com uma certa naturalidade chegou-se ao equilíbrio entre oferta e procura, no entanto, mais tarde (finais dos anos 90), e porque se manteve os mesmos pressupostos, com uma certa rapidez a situação inverteu-se.

A angariação de imóveis era feita essencialmente em regime aberto, não havia uma mais-valia de oferta de serviço percecionado, não existia formação para o desenvolver, e sobretudo, pelo facilitismo que ainda existia na disponibilização entre oferta e procura, trabalhava-se na transação fácil, na faturação, e não na rentabilidade, o importante nesta fase era ter volume de transações. Vamos chamar este ciclo de ciclo da oferta.

Hoje estamos numa altura muito parecida, de facto começamos de há dois anos para cá num ciclo de oferta. Existe mais procura do que oferta, os preços sobem, entram novos players no mercado, a maior parte deles atraídos pela oportunidade, sem formação, e com pouca orientação para projetos a médio-longo prazo, pessoas focadas muito mais no aqui e no agora.

Mas vamos voltar um pouco atrás e relembrar um passado mais recente, o subprime, crise que se iniciou em 2008 nos Estados Unidos, mas que se considera que teve efeitos colaterais apenas a partir de 2010 em Portugal (na minha opinião começou bem antes).Em Portugal começou-se a verificar excesso de oferta a partir do princípio do século, aliás, o último pico máximo de construção de fogos dá-se em 2002, a partir deste ano os índices de construção verificariam baixas consecutivas, mas o excesso de oferta já existia, o que provocou um desequilíbrio entre procura e oferta, originado ações de baixa constante de preço para estimular e escoar produto, no entanto, chegou-se a um ponto em que mesmo com estas ações, a dificuldade de venda mantinha-se. As angariações começaram a ser fáceis de obter, pois os imóveis não se vendiam com a mesma facilidade, os tempos médios de absorção de um produto imobiliário começaram a alargar-se, e ao juntarmos a isto tudo, a já referida crise financeira do subprime que condicionou a obtenção de financiamento, veremos que a grande fatia do mercado (segmento médio e médio/baixo) foi forçada a arrendar para habitar. As transações médias de mercado baixaram de ano para ano, até estabilizarem por volta de 2013-14, por esta altura muitas mediadoras e agentes imobiliários começaram a desaparecer, e por outro lado, começa a haver uma sensibilidade maior para a necessidade de definição de um sistema adaptado e de formação para garantir eficiência e rentabilidade nas transações, e por conseguinte, no negócio da mediação imobiliária per si. Os profissionais começaram a dedicar-se cada vez mais à Prospeção e Angariação de produto vendável, ou seja, a regra passa de angariar tudo para angariar apenas o que se vende. A exclusividade começa a fazer sentido, não por ser nesta fase mais fácil de obter, mas sim por ser um serviço percecionado pelo cliente como um serviço de valor e de resultados que procurava resolver um problema que nesta altura era grave, por isso, o apoio de um especialista para resolver a situação passa a fazer sentido. Passamos a estar no mercado do comprador, estamos no ciclo da procura.

Olhando para a história, ambos os ciclos de mercado (oferta e procura) se revezam durante décadas: 1992-2001 (9 anos); 2002-2014 (12 anos); 2015 até hoje (3 anos com futuro ainda por definir). A pergunta que se impõem agora é: “Será que estamos a meio do ciclo de oferta, e que em breve começaremos a descer?”.

Outra coisa que aprendemos é que hoje as mudanças são cada vez mais rápidas, a tecnologia está a tornar tudo mais próximo e mais instantâneo, e se assim for, será necessário verificar que em breve tudo poderá repetir-se novamente devido a novas nuances conjunturais inesperadas. Mas…será que nos podemos preparar? Será que aprendemos com os erros do passado? Será que a mudança deverá ser antecipada?

Creio que sim, e hoje com muito mais partilha de experiência e know-how que podemos por exemplo encontrar no fabuloso livro que vos falei atrás, “Shift” de Gary Keller, e é com base na minha experiência e neste livro que partilho aquilo que considero ser importante para trabalhar em cada um dos dois ciclos:

Ciclo da Oferta – Buyer’s Market

  1. Ter um bom Plano de Prospeção;
  2. Fazer a angariação em 2 tempos, num tempo máximo de 48 horas;
  3. Ter muita atenção aos valores da hipoteca, poderão por vezes estar mais altos do que o valor pedido no mercado (asking price);
  4. Fazer um ACM (análise comparativa de mercado) real e angariar a preço, ou por vezes, ligeiramente abaixo, pois a tendência neste mercado é descida de preço;
  5. Aconselhar o cliente vendedor a aceitar a primeira proposta que apareça, com a devida ponderação, pois neste ciclo de mercado, as propostas são relativamente escassas;

 

Ciclo da Procura – Seller’s Market

  1. Ter um Bom Plano de Prospeção, muito exaustivo e diversificado. Perguntar sempre: “Precisa de vender o seu imóvel hoje, ou quer vende-lo por um valor mais alto?”;
  2. Fazer a angariação em 2 tempos no mais curto tempo possível, mas sem saltar as etapas;
  3. Atualizar o ACM mensalmente verificando se a tendência de subida se mantem, ou se começa a estagnar. Manter o cliente vendedor sempre informado;
  4. Fazer um ACM real e angariar a preço, propondo a estratégia da baixa de preço (técnica do pescador) sem nunca exceder os 10 a 15% do valor encontrado no momento. Ter um compromisso por escrito do cliente vendedor;
  5. Aconselhar o vendedor a gerir bem as várias propostas que vai receber, com a devida ponderação, pois neste ciclo de mercado, as propostas são constantes;

 

De uma coisa estou certo, no mercado da mediação imobiliária e durante os ciclos que o caracterizam, não sobrevive o mais forte, nem o mais inteligente, sobrevive quem tem melhor capacidade de adaptação!

 

Artigo inspirado na leitura do livro “Shift” do Gary Keller.

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