01 de Maio, 2019

Caro ou Barato? Comparado com o quê?

Massimo Forte

O mercado imobiliário está a atravessar uma nova fase de mudança, depois de anos consecutivos de subidas de preços dos imóveis, começamos a ter os primeiros indícios de algum abrandamento, dando origem à palavra de reajustamento de preços, mas o que querará isto dizer?

Existem pelo menos três pontos a considerar, para conseguir responder à pergunta inicial deste artigo:

 

Capacidade de aquisição da procura.

O aspeto mais importante a considerar para definir se o mercado está caro ou barato tem a ver com o poder de aquisição da procura. Se a maior parte da procura não tem condições financeiras ou de endividamento para adquirir um bem imóvel, então o mercado está caro, caso contrário, podemos dizer que o mercado está equilibrado ou mesmo barato, é sempre importante analisar e considerar a localização, o tipo de compradores, ou os potenciais interessados. Nos últimos anos houve muitas zonas em Portugal que foram adquiridas por estrangeiros, ou seja, pessoas de outros países e de realidades muito diferentes das nacionais, não só de valores mais altos de imóveis, mas também, de um poder de compra mais elevado, assim sendo, para essas pessoas os imóveis em Portugal são baratos quando comparados com os valores praticados nos seus países.

Esta consideração terá de ser feita também para os portugueses, ou para as pessoas que já residem e vão continuar a residir e a fazer a sua vida quotidiana no nosso país, será que para estas o mercado está barato? Na minha opinião claramente que não, generalizando, diria que o comum dos mortais em Portugal começa a ter muita dificuldade na aquisição de um bem imóvel, seja porque não tem capital suficiente para o fazer, ou porque não tem capacidade suficiente para conseguir pagar uma prestação. As empresas financiadoras e bancos hoje calculam muito bem este último fator, chamam-lhe taxa de esforço, taxa que calcula a relação entre o que a pessoa recebe de rendimento e os encargos que pode suportar, entre eles, a ou as prestações bancárias, se esta relação exceder os 35 a 40%, não será aconselhável que essa pessoa contraia um empréstimo hipotecário por não ter condições de o cumprir. Sabemos que quanto mais altos forem os preços dos imóveis, mais altas serão as prestações dos financiamentos e não havendo um aumento do rendimento que acompanhe esta tendência, os imóveis tornar-se-ão caros, ou ainda mais caros para a maioria. Esta regra também se aplica aos arrendamentos, a meu ver, com um risco maior, pois a decisão da contratação é feita de uma forma empírica e muitas vezes emocional, dando depois origem a incumprimentos porque a renda se torna demasiado cara.

Resumindo, os imóveis estão caros ou baratos, tendo em conta a capacidade de aquisição dos potenciais compradores, ou ainda, a sua capacidade de endividamento.

 

Localização, localização, localização.

Haverá zonas do país que possivelmente continuarão a subir de preço, outras que irão estagnar, um fenómeno provocado pela localização e inevitável escassez dos próprios imóveis em determinadas zonas. É importante relembrar que os preços subiram muito nos últimos anos porque o país vinha de um período de crise económica, financeira e imobiliária muito forte, onde os bens atingiram mínimos de valores históricos. Nesta fase Portugal era considerado um país barato para investir, tendo em conta a comparação com outros países europeus e considerando que havia ótimas infraestruturas já na altura e no futuro previam-se outras tantas, facto que atraiu muitos investidores de fora. Resumindo, se quiser adquirir ou vender um bem imóvel, compare sempre localizações similares e limítrofes geograficamente, além disso, compare o potencial das zonas e imóveis similares, lembre-se, as casas são todas diferentes.

 

1 euro, é sempre 1 euro, o m2 pode não ser…

Muito se fala sobre valor do euro/m2, quase como uma métrica referencial para definição de um preço de um bem imóvel e mais uma vez, compara-se preços por m2. Muito bem, todos sabemos que uma das medidas principais para caraterizar um imóvel são os m2, fórmula básica de comprimento vezes a altura da superfície que se pretende calcular, o principio básico é de facto este, mas se existirem diversas interpretações de áreas dos imóveis, tudo poderá mudar. Em Portugal existem pelo menos 5 tipos de áreas diferentes: 1 área útil; 2 área bruta; 3 área bruta privativa; 4 áreas acessórias; 5 áreas de terreno. Todas estas áreas estão bem definidas no RGEU (Regulamento das Geral das Edificações Urbanas) e por isso, são todas elas certas e validadas, a questão é que quando se compara preços euro/m2todos sabemos a que corresponde 1 euro, mas não temos a certeza ao que corresponde o m2, será que são consideradas as áreas do interior das paredes ou não? E os terraços? E as partes comuns do prédio? Quando compramos ou vendemos temos de considerar o imóvel num todo e não podemos desassociar o imóvel do prédio onde está inserido, ou do terreno onde está implantando. No caso do mercado residencial, não há uma convenção de áreas, o que quer dizer que não existe uma regra para considerar o tipo de área quando se compra ou vende, criando assim grandes discrepâncias nos valores e consequentemente, algumas confusões na informação e negociação.

Resumindo, para utilizar a comparação em euros/m2certifique-se que as áreas consideradas na comparação são as mesmas, caso contrário, estará a comparar alhos com bugalhos.

Por fim, não podemos ainda esquecer a lei universal da subida e descida de preços, ou seja, o desequilíbrio entre a oferta e procura. Se houver muita oferta disponível face à procura existente os preços terão tendência a descer, veja-se o que aconteceu no período da TROIKA, se a esse fenómeno juntarmos as restrições de financiamento, a descida de preços será inevitável, como de resto aconteceu nessa época. Se pelo contrário existir pouca oferta face à procura e se a procura tiver condições de aquisição, poderemos assistir a uma subida considerável de preços, o que aconteceu nos últimos anos em grande parte do país.

Quando se diz que as casas estão caras ou estão baratas, a pergunta que se impõem sempre será sempre, comparadas com o quê?

 

Publicado na Visão Online.

Comentários (1)

Pedro Silva

02 de Maio, 2019

“Capacidade de aquisição da procura.” Existe capacidade financeira mas também existe capacidade emocional. Muitas das pessoas que procuram uma casa muitas vezes procuram-na de forma irreal, por mais que o consultor imobiliário em frente deles lhes apresente uma atrás de outra atrás de outra atrás de outra proposta que se adequa quer às suas necessidades, quer à sua capacidade de endividamento. Numa grande parte do território o mito de que uma moradia isolada está ao alcance da classe média está de tal forma impregnado na mentalidade dos clientes compradores que literalmente qualquer reunião começa com o “não quero ver moradias em banda”. E depois uma grande parte dos clientes compradores também são clientes vendedores, ou seja, têm de vender o seu imóvel para adquirir outro imóvel. E aqui surge quase uma divisão na mentalidade das pessoas, uma espécie de bipolaridade temporária, em que o imóvel que estão a vender… o apartamento que compraram em segunda mão e onde não fizeram quase nenhumas intervenções nos últimos 15 anos… é extremamente valioso, quase o suficiente para passar para o escalão seguinte na “escada da vida”, porque são bombardeados diariamente com publicidade na caixa de correio o que lhes diz o quão ampla é a procura para o seu precioso ninho. Segue-se a mudança nos rácios de poupança. Em 1990 a poupança média bruta em Portugal era de 7.188,6€ para um rendimento médio de salários e ordenados de 21.287,6€. Hoje os mesmos salários médios em Portugal são de 64.026,3€ e a poupança? … 64.026,3€. Mesmo se ajustarmos em termos do custo de vida, os padrões de consumo mudaram drasticamente com as pessoas a terem por adquirido um conjunto de hábitos que seriam impensáveis à 30 anos atrás. A ideia de poupar seja para o que for é totalmente alienígena para a maior parte dos consumidores. Não é raro chegarem até nós interessados em imóveis que tendo entre eles 30k de RAB não podem atingir os 200k de financiamento para compra de imóvel. Motivo quase universal: um conjunto de créditos ao consumo.

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